segunda-feira, 5 de outubro de 2009

O Mendigo*

Um Brasil amado
do carnaval e do futebol.
Um país das riquezas naturais
e das pobrezas sociais.
Uma nação emergente
que quer ser feliz.

Um território de contrastes,
onde há bairros nobres de um lado
e favelas do outro.
Talvez belo pela diversidade.

Um povo unido e sofrido
que sozinho no escuro
procura a luz da saída.
Uma criança, uma esperança,
é a última que morre.
Quem primeiro morre
é o mendigo brasileiro,
aquele procurador da cachaça
como solitária alternativa.

Seu Vicente precisa de lareira,
um fogo, um chá quente
que lhe aqueça durante o inverno.
Sua casa é a calçada, num dia,
o viaduto, no outro.
Sua cama é o papelão
enquanto dure,
depois não há cama.

Há uma juventude que luta,
protesta, implora, chora, morre,
ama e faz versos.
Que ainda briga por seus direitos.
Direitos, nem pensar,
Seu Vicente não os têm.

Na madrugada fria de 6 de junho,
jovens queimam,
jovens dão a um mendigo o fogo
do qual o pobre homem
não precisava.
Um fato, me parece,
já costumeiro.
Uma cena que se repete;
Uma platéia inexistente;
Um palco variado;
qualquer lugar,
Brasília, São Paulo,
Rio de Janeiro e Porto Alegre.

Em 1500 Pedro Cabral
descobre pessoas felizes e,
principalmente, livres.
Meio milênio depois
há muitos tristes e presos
por alguns malditos desumanos.
Um deles é Vicente Cabral,
com 62 anos,
teve queimaduras em 20% do corpo.

Impiedosamente queimado
por um grupo de jovens.
cheiravam Loló
na Avenida Borges de Medeiros.
Fora de si, pecam perante Deus,
que ali está de corpo e alma
em seu descanso noturno.
- Meu Deus! (E tomam
seu santo nome em vão)
Não adianta mais,
fato, por vocês, já consumado.

O mendigo, por gente de coração,
foi levado ao Hospital
de Pronto-Socorro.
Via-se em estado grave.
Um socorro dêem a estes jovens,
estão carentes, eles têm inveja de mim.

Pensam que sou um objeto,
um brinquedo, mas não sou.
Acreditam que sou diferente,
discriminado, mas sou como eles.
Crêem que estou vencido,
mas sou muito forte.
Sou Vicente Cabral, de carne e osso,
de nome e sobrenome.
Bebo cachaça, não tomo chá quente,
me esquento do jeito que der,
só não quero ser queimado.
Por isso, agora, a noite esfriou,
o povo sumiu e a luz apagou.
E agora, Vicente?

*Baseado em fatos reais.

por Aleco Mendes (como todos os textos, só pra lembrar... hehe)

2 comentários:

Val disse...

Primo!! Muito legais as poesias, profundo... Parabéns, você é demais!! beijos

Fanaticolorado disse...

loukura